sábado, 14 de maio de 2011

Crônicas da Ibiraquera - pós ( Março-2001)


Em um momento confuso da vida, nada como abrir o rascunho do blogger e achar esse que post, que sabe-se lá pq, nunca foi postado.

Crônicas da Ibiraquera- Pós 1:



Se tem alguma coisa que a Ibiraquera me faz pensar e me faz lembrar sempre, é sobre o valor do momento.Estar presente no momento de corpo e alma, estar consciente. Isso não é nada extraordinário, pelo contrário, é bem simples. Significa que quando estiver caminhanhando, estaremos apenas caminhando, sentido cada parte do corpo, vivendo aquele momento. E sempre que me pego pensando no futuro, imaginando coisas que talvez nunca acontecerão, ou em tantas outras que já aconteceram, sempre tento voltar ao instante. Cada instante é belo, cada um deles cria a sinfonia perfeita da vida. Se não fosse aquele subir de escada, aquela caminhada, aquele momento, todos os outros não seriam possíveis. É por isso que lembro dos momentos felizes que vivi nessa praia, mas também sei valorizar o momento de agora, sentada no meu computador, com minhas duas filhotas emboladas comigo ( minha cachorra e minha gata) e achar aquele tão perfeito como esse. È por isso que posso subir as escadas do meu apartamento acompanhada em um dia, sozinha em outro e achar os dois momentos maravilhosos. Essa praia e principalmente alguém em especial, me fez dar um valor maravilhoso para a vida. Talvez também, uma postura tão livre e desapegada, que assuste.
Viver no presente, não significa que a gente vá sair e fazer tudo que tem vontade, que a gente vai achar que vai morrer amanhã. Significa descobrir o que queremos da vida, o que temos que fazer para isso e valorizar cada passo e não o objetivo final, então não teremos frustrações e sim felicidade plena. É pensar como cada ato nosso reflete no mundo e o que realmente estamos fazendo nele e por ele.
É saber valorizar os momentos que passamos com as pessoas, é amar intensamente em cada segundo, mesmo com a certeza que no outro dia nada será igual. E isso é felicidade, não precisar de um local, não precisar de uma circunstância, não precisar de alguém, é ser livre. Não para todo mundo é claro, mas para mim sim. Tenho certeza que dessa maneira, a vida vai se desenhando como a gente quer.

Crônicas da Ibiraquera-Pós 2

Um dia na praia, fui anotar algo em um papel e peguei meu bloco e virei as páginas. Nele estavam centenas de compromissos do semestre anterior. Quando estava estudando para o mestrado, trabalhando, fazendo inglês, monografando, apresentando um programa de tv e tantas outras coisas que ocupavam meus dias. O Shariff estava do meu lado, mostrei para ele a lista de atividades e ele me olhou surpreso:
- E se tu quisesse riscar alguma dessas atividades tu poderia?
Aquela pergunta me deixou surpresa, para ele era uma coisa simples, mas para mim me fez pensar e repensar minha vida. Hoje, diria que sim e que não. Sim, se eu quiser não fazer nada um dia eu posso, sei que o mundo gira sem mim e que não sou imprescindível, para nada. O mundo caminha sozinho e não pára. Ao mesmo tempo, diria que não, que se deixar de fazer uma daquelas coisas, a minha vida vai se complicar, as coisas vão acumular e etc. Mas, mais importante que isso, é que eu realmente não me importo de estar fazendo mil coisas, porque sei o valor que cada uma delas tem em minha vida, reflito sobre isso dia e noite, sobre o passado, o presente e o futuro e mais do que tudo, hoje na minha vida, busco pôr amor e alma em cada coisa que escolhi para ela.
E quando estou caminhando na rua, olho para cima, olho para o chão e me concentro no momento presente, muitas vezes lembro desse dia e penso que para alguma coisa ter valor, preciso fazer ela consciente. Às vezes andando no ônibus da faculdade, às vezes passando por centenas de pessoas no centro da cidade média na qual eu moro, olho para as pessoas e Gourdieff vem à minha mente. Ele fala sobre os nossos estados de consciência e como a maioria das pessoas vivem o dia-a-dia em um “sono”. Em como fazemos as coisas mecanicamente, como simplesmente passamos pelos momentos, pelas horas, pelos dias, pelos anos. De repente “desperto”. Vejo o “prana” brilhando por tudo, o “prana” são os pontos de energia, eu não costumava ver, mas agora vejo. Não diria que é algo sobrenatural, se tu estiver presente, sejá lá o que estiver fazendo, vai ver também. Vai ver a beleza da vida. Acho que o lindo é isso, colocar mais luz e amor nos nossos dias.

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POde ser que seja maravilhoso passer o dia meditando. Mas acho que isso não é para mim, pelo menos por enquanto, prefiro meditar nos momentos da minha vida. Fazer tudo que tenho que fazer, jogar todo os jogos sociais, desempenhar os papéis sociais que tenho que desempenhar, sabendo lá no fundo o que é verdade e o que é realmente importante. Não me apegar a nada disso, a gente precisa desempenhar papéis o tempo todo no “Mundo real”. Aguentar o ego das pessoas, respeitar cargos e pessoas arrogantes, escutar um monte de besteiras, ver as pessoas dando um valor exagerado para o ter e não para o ser, vestir as roupas adequadas para situações adequadas, se comportar conforme esperem que tu se comporte. Mas nada disso somos nós mesmos.
Se tem uma coisa válida que o mestrado me trouxe é reafirmar essa concepção, que somos frutos sociais, do que a sociedade espera que sejamos e ela que nos condiciona em quase tudo, principalmente com a mídia. Passo horas por semana lendo e discutindo as formações de identidades na socidade, o poder, as representações. Mas não consigo pensar só nisso como uma verdade absoluta. Não consigo pensar que somos só reflexo do nosso meio, claro que se eu nascesse na índia, seria completamente diferente do que eu sou.

Mesmo que tivesse valores diferentes, acho que tem valores que são universais, como o respeito e o amor. E a religião é algo que transcende a questão social. Sei que isso é uma questão de crença, que cada um tem a sua, cada um acredita no seu Deus e nada é provado. Sei que as teses sociológicas tem bem mais respaldo, são paupáveis, a sociedade é assim. Mas sabe, não consigo acreditar nisso, simples assim.
Minha relação com a religião não é pensamento, como são todas essas teses. Bem na verdade, todas essas teses também são feitas,contestadas e refeitas, não existe verdades absolutas. Por isso, acho que mais que interpreter e analisar, coisas que muitas vezes enlouquece os homens, às vezes é preciso sentir. Eu sinto. Cada vez que olho o mar na ibiraquera eu sinto que eu não sou só um “Produto social”, eu me encontro comigo mesma, sei que devo existir há muito tempo e que minha vida não vai acabar quando meu corpo acabar. Eu sinto, que o homem criou tantas coisas feias, mas que por meio da consciência, podemos ter um mundo lindo, como uma praia. Eu sinto, que toda minha inquietação deve ser transformada em amor por aquilo que eu faço, para que o mundo possa ser pelo menos um pouquinho melhor. Sei que se a gente estiver em paz conosco e puder ajudar só as pessoas a nossa volta já está bom, mas acho que todos tempos também um dever com o mundo, se somos os únicos seres com consciência, capaz de saber que o mundo é tão lindo e perfeito como a ibiraquera, porque não pensar em agradecer pela nossa vida e por todas essas bençãos que temos e fazer algo por ele? No fundo, religião e ciência tem que caminhar lado a lado. É lindo vivenciar o momento sem fazer nada na ibirauqera, apenas contemplar, mas é lindo voltar para Santa Maria e sentir que estou contribuindo com o mundo de alguma maneira. Então a ibiraquera nos prova, que belo são as contradições, mais um vez. Nada como por os pés na areia.